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domingo, 7 de outubro de 2018

Compreensão do tempo e do espaço

Artigo sobre o texto Futuro do Passado, de Nelson Brissac e Maria Celeste Olalquiaga, produzido em 7 de outubro de 1996 para a disciplina Análise à Informação, do Prof. Jorge Lúcio de Campos, enquanto eu estudava no primeiro ano da ESDI.

Tempo e espaço sempre foram duas barreiras que o homem nunca conseguiu ultrapassar. A necessidade de ganhar mais espaço e de impedir a ação do tempo levou o homem a elevar o grau de ficção dentro da realidade, para poder formular hipóteses, muitas vezes, esdrúxulas.

Uma sociedade industrializada tem, como consequências naturais, uma explosão demográfica e uma gigantesca urbanização. O aumento das relações comerciais e das cidades começou a exigir um espaçamento exacerbado não esperado.

Mas aos poucos, foi-se adaptando toda a sociedade para minimizar o uso de diversas coisas, escondendo a real grandeza do problema Espaço. Isso foi favorecido, é claro, como toda a vida prática de nossa sociedade, pelos avanços tecnológicos. A informação, por exemplo, foi transformada em bits. Uma quantidade enorme de informação pode ser armazenada em apenas um disquete de computador. Horas de imagens podem ser gravadas em uma fita de videocassete.

Quando o homem pisou na Lua, todo o mundo festejou a conquista de mais um local para poder expandir suas capacidades. Talvez a Lua fosse a resposta para o problema Espaço. Todos aqueles sonhos de colônias espaciais caíram por Terra, quando se descobriu as dificuldades de explorar o terreno lunar. Tudo, então, entrou num processo de compactação na tentativa de impedir a compressão do espaço, pois a cortina criada para encobri-la já estava há muito transparente.

A ação do tempo é um fator que o homem sabe que não pode controlar, como fez com tudo em que pôs a mão.

O novo e o velho são conceitos muito usados dentro de uma sociedade industrializada. Tudo em nome de uma produção encomendada por um mercado consumista exigente. Isso leva à procura de materiais de maior resistência que dêem maior durabilidade aos produtos. Nossa sociedade industrializada viu a necessidade desse tipo de produto para baratear sua ação no futuro.

As ambições do próprio homem em querer viver mais para poder conhecer o futuro almejado e, até mesmo, criado com sua ajuda influenciam filosofias temporais, que levam a viagens ao passado, e tentativas de criogenia (processo de congelamento do corpo humano para impedir a ação tempo e permitir que haja um despertar tardio). Tudo para também esconder o problema Tempo, estimulado pela vaidade das mulheres, que pedem cosméticos e cirurgias plásticas para impedir que seus corpos envelheçam. O desejo de voltar no tempo para consertar os erros do presente e impedir falhas maiores no futuro começa a se repetir compulsivamente.

Motivada, então, por um avanço acelerado da tecnologia, pela produção de bens de maior durabilidade e pelas ambições temporais e pessoais, a sociedade começa a realizar saltos na sua cronologia natural, às vezes, perdendo estágios importantes, mas diminuindo o curso temporal que deveria seguir.

Conclui-se então que a sociedade passou a minimizar distâncias e intervalos de tempo através de simulações esquematizadas e diagramações eletrônicas, alcançando tempos e lugares, que eram apenas imaginação ou devaneio, em deslocamentos instantâneos. O ideal de futuro deixa de ser algo distante que precisa de anos para acontecer, e se torna um objetivo próximo e breve.

FUTURO DO PASSADO, EM TERMOS DE UMA ANÁLISE DO PANORAMA SÓCIO-CULTURAL CONTEMPORÂNEO
A expressão Futuro do Passado, título do texto de Nelson Brissac Peixoto e Maria Celeste Olalquiaga, nos remete a pensamentos espaço-temporais. Pensamos em passado, presente e futuro. Seria fácil dizer que o futuro do passado é o presente. Mas estaria errado.

Se estudarmos a conjuntura social do passado, teremos desejos e anseios bem diferentes dos nossos, porque as realidades são diferentes e nos permitem outras possibilidades.

Na década de 50, o futuro era a década de 90. Tudo aquilo que se esperava do futuro teria que ser exatamente o que é hoje se pensássemos que o futuro do passado é o presente. Nessa época, o mundo acabava de passar por uma grande guerra e enfrentava as agruras de uma bipolarização. A Guerra Fria levou o mundo a uma corrida armamentista que acabou investindo maciçamente em tecnologia, seja ela bélica ou não. Essa tecnologia pós-guerra levou a um deslumbramento, expressado pelo consumo de massa que eclodiu. Gigantescas estruturas vazadas ou envidraçadas se alastraram pelos subúrbios distantes, formando novos centros urbanizados, ligados por imensas auto-estradas. Os ideais de "quebra de fronteiras" e "imensidão infinita" rodeavam a imaginação dessa sociedade. Mas as possibilidades abertas para o futuro não eram só de progresso. O temor atômico, gerado pela mesma corrida armamentista e pelo exemplo de Hiroshima, também trouxe ideais apocalípticos. Foi criada uma iconografia futurística, capaz de criar futuros prováveis, dentro das possibilidades de um contexto social e internacional.

Nosso presente é caracterizado por uma perda da identidade do futuro. Ao estudar um passado que idealizou um futuro que não ocorreu, a contemporaneidade entra, então, num paradoxo. O hoje se tornou mais importante, por causa do enorme avanço tecnológico. A automação que se esperava na década de 50, ocorrera, e a ideia de tempo e espaço se tornaram conceitos filosóficos. Essa ausência de perspectiva gerou o fenômeno "retrô". O ideal de futuro passou a ser adaptações avançadas dos antigos. Viagens interplanetárias, invasões extraterrestres e criaturas mutacionadas geneticamente ou por acidentes radioativos. Toda e qualquer sensação de futuro é retirada do passado. Mas o avanço tecnológico trouxe também um exagero da artificialidade, que impossibilita qualquer mistura entre ficção e realidade.

O panorama sócio-cultural contemporâneo fica marcado por uma sociedade pós-industrial, que dificulta quaisquer projeções futuras. Constitui seu futuro de imagens do passado. Assim, o significado de Futuro do Passado se esclarece como uma possessão literal, ou seja, nossa sociedade contemporânea toma o passado como esperança e/ou exemplo para o futuro.

O CINEMA PODE SE REVELAR UMA VALIOSA VIA DE DISCUSSÃO DA QUESTÃO PÓS-MODERNA
Apesar de ser uma ficção, ou seja, apenas histórias inventadas, o cinema é capaz de problematizar situações e solucioná-las de diversos meios. Muitas vezes essas situações se assemelham a acontecimentos reais.

Para que um filme fique o mais realista possível, é preciso estudar uma época e retratá-la com mínimos detalhes, seja no cenário ou no método de pensar e agir das personagens. Assim, o cinema se torna um reflexo da sociedade da época e de seus ideais.

No texto Futuro do Passado, os filmes de ficção científica foram utilizados para a realização de uma análise sobre as crenças no futuro da nossa sociedade nas décadas de 50, 60 e 80. Fica claro que a conjuntura internacional e a tecnologia influem no modo de pensar e imaginar como será o futuro.

Na década de 50, uma sociedade pós-guerra, que idealizava um paradoxo entre progresso e degradação, realizava filmes que mostravam uma tecnologia hipotética avançada, invasões extraterrestres e viagens espaciais, expressando o encantamento com a tecnologia real, que avançava junto com a industrialização. A artificialidade dos ambientes cinematográficos conduziu a uma estilização do real, que gerava diversas possibilidades de futuro.

Já na década de 60, essa estilização deixou de ser ficção para se tornar realidade. Inicia-se um processo de desaparecimento do ideais de futuro. Toda aquela automação e mobilidade da década passada se tornaram imagens trazidas do passado, para compor um futuro iconográfico. Os filmes ganharam formas aerodinâmicas e uma eletrônica ampla e simbolizada.

Os anos 80 também foram retratados no cinema. A cultura pós-apocalíptica e nostálgica da época se transformou num retrocesso hiperartificial. A já degradada sociedade e a desumanização fazem parte do cotidiano e são conduzidas às projeções imaginárias de um futuro próximo.

Assim, se o cinema é capaz de retratar a sociedade contemporânea, mostrando personagens, momentos e valores, é capaz de se revelar uma valiosa via de discussão da questão pós-moderna. Uma análise profunda pode dar temas para diversas discussões.

terça-feira, 1 de maio de 2018

Reflexões sobre o livro "Transparência do Mal – Ensaios sobre os fenômenos extremos", de Jean Baudrillard

Texto produzido em 1º de maio de 1996 para a disciplina Análise à Informação, do Prof. Jorge Lúcio de Campos, enquanto eu estudava no primeiro ano da ESDI.

ENSAIO 1: "APÓS A ORGIA"
Toda boa redação deve ser dividida em introdução, desenvolvimento e conclusão. Na introdução, devem estar o tema central e as ideias a serem abordadas. O ensaio "Após a orgia" é como uma introdução.

Baudrillard apresenta uma série de argumentos demasiadamente radicais, caóticos e negativos. Chegou a me lembrar o poeta pré-moderno Augusto dos Anjos, que escandalizou sua época por usar um linguajar rebuscado e negativo. Sua radicalidade se expressa pelo excesso de palavras como "tudo", "todos", "nada", "jamais", que, em Geografia, aprendemos a não usar por serem tão generalizantes.

O autor define "orgia" como "o momento explosivo da modernidade, o da liberação em todos os domínios". E é nesse pensamento que se seguem seus outros ensaios, explicando-se uma série de liberações de nossa sociedade, relacionadas sempre com a pergunta crucial do livro: O QUE FAZER APÓS A ORGIA?

Não acho que nossa sociedade tenha percorrido "todos os caminhos da produção e da superprodução virtual de objetos, signos, mensagens, ideologias, prazeres". Nossa sociedade tradicional é calcada no ideal de progresso, onde o espaço de experiência é diferente do horizonte de expectativa. Isso nos leva a analisar uma sociedade que sempre procura melhorar através de mudanças sejam elas boas, ou não. Assim, fico impossibilitado de dizer que estamos progredindo no vácuo. Nós não vivemos uma reprodução indefinida em um tempo cíclico de saber no passado. O homem surpreende a toda hora e pode alterar seus ideais e sonhos, vivendo um tempo linear de saber no futuro.

Baudrillard argumenta que as coisas não desaparecem por morte ou fim. A proliferação, saturação, exaustão e epidemia das mesmas podem realmente levá-las a um fim dispersivo. O cineasta Wim Wenders diz que numa cidade grande, onde o acúmulo excessivo de propaganda é alienante, o tudo acaba se tornando o nada. É exatamente isso que o autor quer dizer: perde-se o sentido e a força quando se chega à contaminação exacerbada.

A trilogia do valor é facilmente entendida graças ao feedback que possuímos, uma vez que não há uma explicação clara e bem desenvolvida do tema. As atenções se voltam apenas para o quarto valor: o valor fractal. Esse valor é dado como o valor de avaliaço impossível que irradia para todos os lados sem referências, de forma aleatória. Isso porque é difícil avaliar o valor do que está em constante mudança, saindo de um eixo ordenado óbvio. Mesmo os opostos não andam mais lado a lado, numa luta eterna pela hegemonia. Esse é o valor fractal. E o autor determina esse valor como o "esquema atual de nossa sociedade". Assim, ele entra num paradoxo que ele diz melhorar o funcionamento de uma sociedade. Ao mesmo tempo que finaliza o ideal de progresso, ele dá um movimento às coisas de maneira fractal.

Esse paradoxo é mal analisado quando se sustenta o ideal de que o progresso, a riqueza e a produção desapareceram, mas continuam existindo. Como falar no desaparecimento das bases político-econômicas de nossa sociedade? É fato que estamos enfrentando momentos difíceis e confusos, mas anular a essência da sociedade? Isso fica exagerado. Concordo com a ascensão do jogo político em contraposição ao fim das ideias, porque (infelizmente) leio jornais para saber o que ocorre no ninho de víboras do governo.

O que, com certeza, possibilitou o homem mudar, ou seja, evoluir para o que é hoje, foi sua curiosidade. Nascida no âmago de todos os seres, essa sede de conhecimento nos levou a lugares incríveis e a descobertas fascinantes. Por isso, fica injusto considerar a curiosidade como uma pulsão secreta em todo ser humano de desfazer-se das ideias e das essências para chegar à orgia, excedendo em todos os sentidos. Nosso objetivo é estudar, experimentar para que alcancemos novas possibilidades e facilitemos a vida de todos.

Talvez seja um grande erro não obedecer ao código genético. Se eu fosse um fanático religioso, diria que a genética é um pecado mortal, uma afronta a Deus. Clonagens e próteses são uma tentativa de driblar os valores naturais. "O máximo da sexualidade com o mínimo de reprodução" é a ordem da liberação sexual. "O máximo de reprodução com o mínimo possível de sexo" é o sonho de uma sociedade clônica. Mas será que chegamos, alguma vez, a um desses dois extremos? Nossa sociedade jamais foi influenciada apenas em sexo ou apenas em clonagens. Ocorre sim, como o autor comenta em seus outros ensaios, uma transexualidade que se estende bem alem do sexo. Não se tem um processo de confusão e contágio; tudo é experimental, são tentativas de formar personalidades próprias e extrapolar seus desejos mais íntimos. Realmente perde-se o caráter específico do sexo e cria-se um processo viral de indiscriminação. Isso, exatamente, porque é algo novo que vai contra os valores sociais e morais de nossa sociedade.

São esses valores que dão margens a essas discussões. O conservadorismo e as tradições que nossa sociedade guarda, de fundo moral e ético, acabam criando paradoxos com a evolução do saber que acompanha o crescimento da humanidade. Há uma dificuldade muito grande em quebrar tabus para acolher os novos conhecimentos.

A comparação entre a metáfora e a metonímia, direcionada ao processo transversal é interessante. A utilização da denotação das duas palavras para dar um sentido conotativo à transversalidade cai perfeitamente nesse discurso. Nesse processo da transversalidade, é fácil perceber essa metonímia ao avaliarmos o campo de ação de uma disciplina qualquer. As disciplinas criaram uma interligação, fazendo desaparecer os vestígios dos conjuntos individuais para formar um enorme termo de coletividade. E é por causa dessa contaminação, dessa infecção de todos os domínios que podemos falar "tudo é sexo", "tudo é política", "tudo é dinheiro". Essa radicalização é bem contestada quando Baudrillard fala que "cada categoria é levada a seu mais alto grau de generalização, e por isso, perde toda sua especificidade e se desfaz em todas as outras".

Há uma análise nesse ensaio, sobre as teorias revolucionárias, que nos faz pensar sobre o tão esperado progresso da humanidade. O capital não leva em consideração os valores econômicos, fugindo de seu próprio significado centralizador, sem quaisquer referências (aliás, raramente o capital seguiu as leis a ele impostas); o político foi questionado e, quando teve suas bases enfraquecidas, levou consigo o social; a arte tentou renegar as regras que a limitavam mais continuou seguindo padrões que levaram à banalidade das imagens; a utopia sexual de tornar a totalidade do desejo como uma realização na vida de cada indivíduo acabou numa confusa transição sexual de circulação promíscua que levam a uma indiferença e discriminação do ato. Ou seja, as tentativas que nossa sociedade fez para melhorar suas condições e seu campo de ação, determinaram o começo da orgia.

O princípio do Mal de Baudrillard acaba por aparecer. A curiosidade que a sociedade carrega instiga uma parte maldita: a vontade de violência e morte. O movimento incessante da sociedade, sempre eficiente e sempre fracassada, na tentativa de disfarçar o Mal, beneficiando o Bem, descreve essa parte maldita do princípio. O autor considera o Bem uma sentimentalidade ingênua que sempre será superada pela energia irônica do Mal.

Acho bem errado dizer que o êxito da comunicação e da informação indica a incapacidade da sociedade se superar através de outros meios. É através da comunicação e da informação que a sociedade, como coletivo, e o indivíduo, como entidade só, conseguem satisfazer sua curiosidade e aprender métodos de superação mais fáceis ou lucrativos. Até mesmo o conhecimento entra num processo de superação, quando seu excesso acaba em dispersão. Ao adquirirmos conhecimento, livramo-nos daqueles que se tornam vagos e ilógicos. Temos, assim, um processo metonímico de comutação. Quando Baudrillard fala que a imagem do homem sentado contemplando o horizonte e seu silêncio se tornará uma bela imagem no futuro, começamos a pensar outra vez sobre a relação tudo-nada, a que se refere Wim Wenders, graças à anulação da presença do silêncio no meio dessa invasão comunicacional e informativa. Acho que esse interesse no silêncio já está, aos poucos, surgindo. Há um anúncio de TV que mantém o silêncio, deixando apenas as imagens e as palavras correrem. Isso quebra o cotidiano de informações ininterruptas e acaba prendendo o telespectador.

ENSAIO 2: "TRANSESTÉTICO"
A arte sempre seguiu regras, que, por sua vez, seguiam os padrões de estética da sociedade. Às vezes ela assumia um caráter próprio por receber as influências dos indivíduos que a moldavam. O que chamamos de "moda", por exemplo, é algo ditado por alguns da sociedade que desejam impôr seus padrões a toda uma sociedade. No entanto, já não existe mais regras fundamentais ou critérios de julgamento. A arte continua com sua força de ilusão, sua capacidade de negar a realidade, perdendo o sentido e a finalidade, para ganhar uma nova forma idealizada. Continua também com suas características de proliferação de seus discursos sedutores e/ou destruidores.

No ensaio "Transestético", percebemos que, sem critério algum, fica difícil haver uma troca de informações no meio estético. A coexistência de diversas tendências artísticas num mesmo espaço cultural nos leva a aceitá-las simultaneamente com uma profunda indiferença. Essa espécie de inércia da sociedade atinge a arte numa estase agoniante, imobilizada pela própria imagem e riqueza de seu passado, deixando as liberdades formais e conceptivas se misturarem com outros estilos sem nenhum controle ou com um controle imóvel.

A evolução do homem, já analisada em função da curiosidade interior, tornou o mundo potencialmente criativo. Sem dúvida, a curiosidade "puxou" a criatividade para perto, onde as experiências podiam ser então melhor observadas e concluídas. Mas o homem experimentou a industrialização da arte e "transestetizou" toda a insignificância do mundo. Essa mercantilização que se viu ao redor da arte mudou o destino da organização semiológica. Qualquer coisa que fosse uma força de expressão, um signo, uma consideração de uma das tendências artísticas sofria ação do mercado. Acabou-se por vender o marginal, o banal como forma de cultura, de ideal estético. A arte ganhou o valor do mercado, perdendo o valor estético do signo. Isso não é uma descrição clara dos Mamonas Assassinas? Todo o besteirol, a lixo-cultura que eles empreenderam se tornaram uma ideologia que é cultuada até hoje, mesmo depois da morte do grupo.

Nesse ensaio, o ideal do transversal é esclarecido. Não é a essência da arte que está desaparecendo ou suas concepções desmaterializando. A estética se proliferou por toda a parte e ganhou uma personalidade mais operacional. Baudrillard diz que é assim que a arte sobrevive: modificando-se de acordo com as regras do jogo, forçando até seu próprio desaparecimento. Mas ele pisa num terreno contrário a arte. A publicidade jamais poderia ser chamada de arte, mesmo que tornemos essa última o mais mercantil possível. Os ideais fundamentais de arte e publicidade entram em choque. Não há passagem de emoção e sensibilidade numa propaganda, assim como a arte, em seu sentido mais puro, jamais será artificial.

O homem é uma criatura iconoclasta. Os ícones nos fazem crer na possibilidade da existência. Toda imagem nos passa alguma coisa, mas a profusão delas nos leva a um apagamento dos vestígios e das consequências. Seria fácil colocar a existência de Deus em questão, mas as imagens transmitidas por ícones não nos permitem deixar de crer. Assim, devemos considerar a arte contemporânea como os ícones e suas imagens, levando em conta sua função antropológica sem critérios ou julgamentos estéticos.

É inútil buscar coerência e destino estético na nossa arte. É impossível julgar belo e feio, condenando a humanidade à indiferença. Essa indiferença gerou o hiper-realismo atual da arte. Não se cultua mais o belo ou o feio. Prefere-se o kitsch e o fascinante, o hiperreal. A arte-pop ganhou força com isso, pois se elevou a potência irônica do realismo.

Essa elevação potencial mexe no meio mercantil, como já foi analisado. As leis do valor também se elevam, o que é mais caro se torna mais caro e os preços ficam exorbitantes. Entra aí o modismo. Essa alteração dos valores supervaloriza alguns artistas, inferiorizando outros, iniciando a arte-xerox, ou seja, uma arte copiada que penetra no paradoxo das regras artísticas.

Para Baudrillard, a arte gira em torno de dois mercados: o da hierarquia dos valores e o da especulação financeira, ficando acima do belo e do feio. Talvez não seja por aí que a arte se desenvolve. Ela cresce por si só, com seus fundamentos de sensibilidade e transmissão de uma mensagem, desafiando os valores, realmente ficando acima deles. Os mercados reutilizam essa arte como uma forma de superar esses valores para controlar o capital flutuante e ficar, ainda, acima do bem e do mal.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Só sei que nem ele sabe!


Se vocês ainda não acompanham Carlos Ruas e suas incríveis histórias com Deus, estão perdendo tempo. Gênio!

sábado, 30 de abril de 2011

Eu queria ser amigo da Sofia

Cara... acho um peso muito grande ficar falando que as crianças são a salvação do mundo. As coitadas ainda nem sabem o que é a vida para já serem responsabilizadas. E, se isso fosse verdade mesmo, os investimentos na área de Educação seriam muito maiores e inquestionáveis.

Mas aí... chega nas minhas mãos um Globinho - aquele caderno infantil do jornal O Globo que ninguém lê - e leio isso:
Eu queria fazer uma poesia
Que não fosse quente
Que não fosse fria.

Eu queria fazer uma poesia
Que não falasse de História
Que não falasse de Geografia

Eu queria fazer uma poesia
Que todos lessem
Que fosse como magia

Eu queria fazer uma poesia
Que não fosse de tristeza
Que fosse de alegria

Eu queria fazer uma poesia
Mas, sem idéias,
Perguntei a minha amiga Sofia

Pra quem não sabe
Sofia parece Filosofia
E, quem não sabe,
Filosofia é ser amigo do Saber

Sofia é esperta, Sofia é legal
Filosofar é uma coisa muito especial
Essa poesia - belíssima em sua simplicidade - foi escrita por Roberta Miglioli Tamabasco, do Colégio Verbo Divino, em Barra Mansa, Rio de Janeiro. Roberta tem apenas 10 anos!!! É nessas horas que tenho certeza que ainda existe esperança, sabe?

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Os caprichos de Goya

Estive hoje no Instituto Cervantes com a turma do segundo ano do Ensino Médio do Instituto de Tecnologia ORT para ver a exposição Los caprichos de Goya. Lá estavam expostas as 80 gravuras em água-forte da primeira série editada por Goya em 1799.

Francisco José Goya y Lucientes (1746-1828) foi um pintor e gravurista espanhol importantíssimo em sua época. Acredita-se que tenha sido responsável por uma evolução na pintura, talvez até um pré-impressionista. Essa série de gravuras foi chamada por Goya de "assuntos caprichosos que se prestavam a apresentar aos coisas ao ridículo, fustigar preconceitos, imposturas e hipocrisias consagradas pelo tempo". Questionava a Inquisição, a educação, a prostituição e o misticismo. Los caprichos coincide com a grave enfermidade que teve, deixando-o surdo e amargurado por toda a vida.

A maioria dos alunos achou sua obra triste, sombria. E não é pra menos se pensarmos que estava doente. Fora isso, toda a Espanha sofria convulsões sociais. Mas seus quadros são de um talento artístico incrível se pensarmos na técnica que ele utilizava para realizar suas obras e fazer uma crítica ácida à sua época. Depois, a turma viu um vídeo sobre Goya e pode ver que ele também foi um pintor academicista sem igual, utilizando cores e luzes de uma forma bela. Inclusive, seus conhecimentos sobre luz e sombra foram transferidos magistralmente para suas gravuras.

A obra central é sua gravura 43: El sueño de la razón produce monstros ("O sonho da razão produz monstro", 1797).


São inúmeras as interpretações que ela nos dá. Considerando que a gravura foi feita em um período iluminsta onde a Razão é a essência do homem, dis-ze que a obra quer mostrar que quando o homem dorme e, assim, a Razão, monstros podem aparecer. Na gravura vemos que os monstros próximos ao homem (que está iluminado) são reconhecíveis como animais, enquanto os que estão na escurtidão são disformes. Isso pode nos indicar um medo do desconhecido, do que pode vir dos cantos mais obscuros de uma mente adormecida. Mas alguns estudiosos acreditam que o sono da Razão pode não ser tão negativo assim, se for olhado como um sonho inspirador ou a loucura criativa, se um "monstro" pode se tornar um "gênio".

Acho essa obra incrível. Linda em vários sentidos. E algumas outras gravuras seguem esse teor de beleza. A exposição é bem pequena, com 40 quadros (cada um com 2 gravuras) e legendas com comentários do Museu do Prado. Vale a pena ver esses originais.